quinta-feira, fevereiro 05, 2004

[Sem título]
Nos últimos dez anos, em particular, as “elites evangélicas” do nosso país e de outros têm-se deliciado a discutir o chamado Pós-modernismo. Das vezes que me tenho pronunciado sobre o tema, tenho tentado fazê-lo com uma certa moderação e não embarcando facilmente nos discursos catastrofistas e apocalípticos que alguns elegeram como mote.
Na verdade, toda esta conversa de que estamos a entra numa nova fase da história, numa nova “Idade” é um demonstração clara de que, afinal, ainda vivemos na Modernidade! Por essa razão procuramos ter as coisas tão estruturadas e sistematizadas. Arrisco dizer que a Pós-modernidade não é mais do que o "canto de cisne" da Modernidade. Continuando na linguagem simbólica poderá também ser a atraente "borboleta" resultante da "lagarta" moderna incipiente, tendo passado pela indefinida "crisálida" moderna e exacerbadamente racionalista.
A Pós-modernidade, se tem existência própria, será mais um estilo de vida do que propriamente uma escola de pensamento com agenda e motivações próprias. É muito provavelmente o "fruto maduro" que cai da "árvore da modernidade".
O pendor fortemente técnico, pragmático e fundamentalmente utilitarista do final da época moderna não consegue ser abalado pela Pós-modernidade, o que pode explicar a surpreendente procura de experiências de cariz espiritual, com um carácter místico muito marcado, mas de natureza fundamentalmente subjectiva e pessoal, o que se integra nesta visão utilitarista do fim da modernidade.
Assim, esta espiritualidade não é fundacional e sustentada em valores estruturantes, externos ao próprio homem (transcendentes, sobrenaturais), mas é tão só a satisfação da secura espiritual a que o homem do fim da Modernidade ficou sujeito.
Isto claramente demonstra que se verifica um contínuo entre a Modernidade e a Pós-modernidade, o que confirma a saturação na proposição de pensamentos verdadeiramente inovadores nos tempos que estamos a viver.
Sem percebermos completamente porquê, a visão mecanicista e tão duramente objectiva do universo moderno é levada a um extremo racionalista que explode metamorfoseando-se num subjectivismo generalizado que, porém, continua a manter o princípio sagrado da Modernidade adulta: o homem como medida de si próprio.
No fundo, a Pós-modernidade pode estar a dar crédito à máxima de que "os extremos tocam-se" pois a sua rejeição visível dos princípios universalistas e fixos da ciência moderna, está a tornar-se, ela própria num princípio demasiado abrangente e que começa a ser atrofiante, pois recusa-se a admitir outras alternativas que não sejam subjectivas em si mesmas. Não será esta mais uma herança da Modernidade? Um certo tipo de "ditadura intelectual", agora vestida com a pele da tolerância e do subjectivo? A espiritualidade como forma de experimentar e viver um corpo de doutrinas e convicções, pode-se afinal ter transformado na razão de ser de uma existência que procura explicar tudo aquilo que somos no contexto exclusivo em que vivemos.
Timóteo Cavaco