sexta-feira, fevereiro 20, 2004

Dia de derby, dia do Senhor
Em Domingo de Benfica vs Porto o fim da tarde passa-se na igreja. Não há casa cheia, a moldura humana não é exactamente a desejada, mas o Fevereiro quente permite uma temperatura ideal para a prática litúrgica
À porta auto-revistam-se os mais fervorosos adeptos (não vão eles terem-se esquecido da Bíblia ou do hinário no carro). Entra-se no recinto ignorando o primeiro pé a poisar. Ninguém se benze. Abjurar superstições é um pré-requisito para a filiação neste “clube”.
Começou. Os cânticos nas “bancadas” são quase um prolongamento dos sorrisos à entrada. Torna-se obsoleto qualquer apito inicial. Começou ou continuou?
Advirto, não me esforço para construir um bom relato. Deixo-me pelo resumo pouco alargado. Em nada posso compensar os que tinham oportunidade de assistir em directo e não o fizeram. Quem ficou em casa não é grande adepto. Nenhuma imagem se me afigura mais obesa, obtusa e obnóxia que a do treinador de sofá.
Corremos de seguida numa pequena porção Salmo 119. Terreno magnífico. Os que não se equiparam lêem pelo vizinho do lado. É fim de tarde no Inverno e a iluminação artificial permite a leitura da “lâmpada para os nossos pés”. Este terreno continua em perfeito estado, apesar de antigo, apesar de estarem todos, tão diferentes, a correr numa pequena porção.
Chega-se ao intervalo com Êxodo 20 no marcador (da Bíblia). Os cânticos voltam às bancadas, às vezes com palmas mas nunca com “olas mexicanas” porque somos evangélicos baptistas.
Aprendem-se minuciosamente as Leis do “Jogo”. No Êxodo, passes certeiros vão desmarcando, um a um, os mandamentos. Conhecê-los é aplicar sobre nós próprios a lei da vantagem. Ignorá-los é arriscar acabar a carreira contrariamente à de Paulo em II Timóteo 4:7. Na Graça cabe mais gente do que no Estádio do Maracanã, mas a porta de entrada continua a ser estreita.
Canta-se faltosamente, em compasso binário, um hino de compasso ternário. Os ouvidos mais sensíveis pedem cartão. O árbitro fecha os olhos. Fecham todos. Remata-se com uma oração. Golo!
Samuel Úria