sexta-feira, junho 04, 2004

Da chatice
Leio um artigo de um evangélico insuflado. A coisa é chatíssima. Reconheçamos: os evangélicos são educados para escrever coisas que nos aborrecem até à morte. Receita: uma tese que edifique, um queixume disfarçado de exortação ética, uma tenrinha esperança de unanimidade, uma presunção de inspiração divina instantânea, um esforço inútil de aparência humilde, uma procura ofegante de objectividade. Clamemos por livramento.
O Samuel Úria já defendeu a teoria há umas semanas atrás. A mediocridade é uma norma que se confunde com o batimento cardíaco das nossas comunidades. Não se defende aqui uma liturgia circense, equívoco que tantos seguem convictos de que o Espírito é um mecenas excêntrico. Não se apoia aqui comunidades "alternativas" ? excrescências como grupos de artistas, intelectuais e endinheirados que não encaixam no conceito tradicional de igreja, como eles gostam de dizer. Não se patrocina aqui manifestos de cidades abaladas pelo magnetismo do centro evangélico local por obra e graça de ideias tão suspeitas como a de "reavivamento". Sou um lacaio inexpressivo da minha igreja na sua acepção mais burocrática. Creio abusivamente que Jesus nos condenou às agruras da membrazia. Deixo os arrebatamentos e as conversões em massa para os fanáticos da bola.
Contudo, parece-me simples afirmar que para nos livrarmos desta praga de frigidez cultural que nos aflige há que entender a igreja enquanto soma de cabeças. Individuais. Únicas. Invioláveis. Prescindamos do exército de ávidos evangelizadores sem escrúpulos para apostar em pessoas. Tão somente.
Um conselho prático, como a turba sempre aprecia: na Escola Dominical ensinar as criancinhas a repetir todos os domingos, a seguir à passagem bíblica da semana, a seguinte frase de Kierkegaard: "a multidão é falsidade". Semeemos. Com a bênção do Senhor colheremos no espaço de 20 anos.
Tiago de Oliveira Cavaco