segunda-feira, maio 10, 2004

A mulher grávida na sessão de igreja
Anda por aí uma gente em orações inflamadas. Clamam por uma igreja verdadeira, sem regras e castrações, cheia de pureza e sem hipocrisias. Com hálitos asseados revelam que não estamos a conseguir comunicar com o mundo. Ulceram-se com liturgias vazias, não encaixam nas pesadas agendas dominicais.
A minha esposa começou a perder líquido amniótico numa assembleia administrativa da Igreja Baptista de Moscavide. A minha filha nascia pouco mais de um dia depois daquelas penosas três horas de parlamentação congregacional. Seria muito melhor passá-las a disfrutar o sol de Domingo.
Quando ouço alguém a escolher a sua fileira no espírito da lei sei imediatamente que estou perante um adversário. Sou uma pessoa que opta sempre pela letra da lei. Não pestanejo. Conheço o meu lado das trincheiras.
São muitas as almas ofendidas pela actual ausência de espiritualidade da igreja. O evangelho não combina com instituições humanas, e por aí fora. Topo esses bonecos de peluche tosquiados à distância. Têm sempre uma amplitude cardiológica superior à minha e um banho tomado há menos tempo.
É cedo falar em educação dos meus filhos. E nada recomendável sequer. Mas espero incutir-lhes muito legalismo. Apego a regras. Desprezo por visões e utopias.
Não existem boas intenções naqueles que julgam saber aquilo que o mundo precisa. Não há bons ventos a sair de cabeças arrebatadas. Dava-me jeito, parece-me, uma reeducação para a mesquinhez. Essa será uma boa reforma para a igreja. Dar mais atenção à sua matéria-prima. À deplorável alma humana.
Acabo com fundamentalismo. Pessoas que fazem fretes são sempre melhores do que pessoas que não fazem fretes. Gente com pachorra para aquilo que não a merece é sempre gente melhor do que gente sem pachorra para aquilo que não a merece. Eu e a minha mulher demos um grande exemplo à nossa filha. Porque o parto foi muito complicado. E as dores começaram na assembleia administrativa da Igreja Baptista de Moscavide.
Tiago de Oliveira Cavaco